O que a sujeira de um módulo fotovoltaico pode causar e quando é necessário limpá-lo?


Este artigo tem como objetivo avaliar os efeitos da deposição de sujeira sobre a superfície dos módulos fotovoltaicos, analisando como isso contribui diretamente para a redução da geração de energia. Vamos abordar uma dúvida comum do mercado sobre a periodicidade com que se deve realizar a limpeza dos módulos fotovoltaicos. Vamos também analisar um estudo de caso desenvolvido pelo Laboratório de Energia e Sistemas Fotovoltaicos da UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas) e publicado no Congresso Brasileiro de Eletrônica de Potência [1]. A sujeira encontrada na superfície dos módulos fotovoltaicos impacta diretamente a geração energética. A sujeira leva a uma redução da irradiação solar absorvida pelas células que compõem o módulo fotovoltaico, podendo em casos extremos causar sombreamento parcialpontos quentes e, consequentemente, um estresse térmico nas células que pode contribuir para o desenvolvimento de microfissuras nas células. Diante de tantos impactos negativos da sujidade dos módulos, faz-se necessária a limpeza com uma periodicidade razoável para que o sistema não tenha a sua vida útil reduzida e para que os proprietários dos sistemas tenham o seu retorno sobre o investimento garantido. A taxa de deposição de sujeira nas instalações fotovoltaicas varia de acordo com os elementos que compõem o ambiente, tais como o tipo de solo, a umidade relativa, a incidência de ventos e chuva, a vegetação e a fauna próximas, além da proximidade de regiões com alta circulação de automóveis ou áreas industrializadas. Considerando todo este espectro de condições, é grande desafio buscar uma fórmula capaz de contemplar todos os tipos de instalações para avaliar os impactos da sujeira e determinar a periodicidade adequada para a limpeza. A principal evidência de que os módulos fotovoltaicos devem passar por um processo de limpeza é a redução de geração energética. Este problema pode ser detectado através do monitoramento ao nível do módulo ou da string, seja com equipamentos do tipo MLPE (module-level power electronics) ou inversores convencionais. Ao se constatar uma queda da geração é necessário realizar a limpeza. Nas usinas solares, a despeito do monitoramento, a limpeza periódica dos módulos é um item obrigatório no  processo de operação e manutenção durante toda a vida útil do sistema. A primeira atitude a se tomar quando se constata uma redução perceptível na geração de energia é verificar o estado de limpeza dos módulos. A sujeira é um dos principais fatores que interferem negativamente na geração, como já falamos. Para evidenciar a necessidade de monitoramento da geração energética para ações de limpeza, apresentam-se a seguir dois casos práticos que demonstram os efeitos da deposição de sujeira nos módulos fotovoltaicos.

Estudo de caso I

O primeiro estudo de caso foi realizado em um sistema fotovoltaico instalado nas imediações do Centro de Integração Social Guanabara – UNICAMP. Este sistema é composto por 1 string de 12 módulos de 190 Wp. O sistema foi atingido por uma forte chuva com ventos, fazendo com que os módulos estivessem sujeitos a uma intensa cobertura de sujeira sobre a superfície. No intuito de se verificar os efeitos da sujeira acumulada, foi utilizado um traçador de curva I-V para realizar medições nos módulos e na string. Para facilitar o estudo os módulos foram numerados conforme a figura 1.

 

Figura 1 Numeração dos módulos que compõem a string fotovoltaica em teste

Figura 1: Numeração dos módulos que compõem a string fotovoltaica em teste

 

Inicialmente, todos os módulos foram medidos sob a condição de alta deposição de sujeira na superfície. O módulo 4 apresentou o pior desempenho, com uma entrega de potência de 152,9 W em STC, com um desvio de 19,5% em relação a sua potência nominal. O seu baixo desempenho pode ser atribuído ao fato de apresentar um padrão de sujeira diferente dos demais.

 

Figura 2 Módulo fotovoltaico nº 4 com sujidade acentuada em relação aos demais e maior desvio de potência em relação ao valor nominal

Figura 2: Módulo fotovoltaico nº 4, com sujidade acentuada em relação aos demais e maior desvio de potência em relação ao valor nominal

 

Este mesmo módulo, após ser devidamente limpo, apresentou uma potência em STC de 170,84 W (variação de 10,1%), apresentando um incremento de 12,09 W em relação à condição anterior, tornando-se curiosamente o módulo de melhor desempenho dentre todos os 12 módulos da string. Nas Figuras 3 e 4 é possível analisar as curva I-V e P-V do mesmo módulo nas duas situações estudadas.

 

Figura 3 Curvas I V do módulo sujo 35 e limpo 41 em condições de STC

Figura 3: Curvas I-V do módulo sujo (35) e limpo (41) em condições de STC

 

 

Figura 4 Curvas P V do módulo sujo 35 e limpo 41 em condições de STC

Figura 4: Curvas P-V do módulo sujo (35) e limpo (41) em condições de STC

 

Deve-se notar que o sombreamento parcial causado pela concentração de sujeira em algumas partes do módulo causou o deslocamento do ponto de máxima potência. Este efeito traz consequências negativas para o sistema, pois acaba limitando a geração dos demais módulos conectados a ele, exigindo que os módulos operem sob condições de corrente e tensão abaixo de seus respectivos máximos. Utilizando este mesmo conjunto de módulos, foi feita uma segmentação de 2 strings, uma suja (módulos de 1 a 6) e outra limpa (7 a 12), conforme a numeração da Figura 1. Para analisar a diferença de geração em OPC das duas strings foram obtidas as seguintes curvas I-V e P-V. A string suja apresentou uma potência máxima em OPC de 577,1 W, enquanto a limpa desenvolveu uma potência máxima de 604,4W. A diferença de 27,3 W evidencia a real necessidade de realizar a limpeza em situações onde há uma discrepância muito grande em relação à geração esperada. Uma manutenção ágil do sistema pode ser providencial para que geração atenda a demanda esperada pelo proprietário do sistema e, consequentemente, evitar questionamentos e dores de cabeça para a empresa que forneceu os sistema fotovoltaico.

 

Figura 5 Curvas I V da string limpa 25 e suja 26 em OPC

Figura 5: Curvas I-V da string limpa (25) e suja (26) em OPC

 

 

Figura 6 Curvas P V da string limpa 25 e suja 26 em OPC

Figura 6: Curvas P-V da string limpa (25) e suja (26) em OPC

 

Estudo de caso II

Neste segundo estudo de caso será analisada uma instalação que obteve uma queda acentuada de geração. A Figura 7 mostra a situação de sujidade em que se encontravam os módulos fotovoltaicos.

 

Figura 7 Módulos do sistema fotovoltaico em processo de limpeza

Figura 7: Módulos do sistema fotovoltaico em processo de limpeza

 

Uma maneira de se identificar que os módulos necessitam de limpeza é o monitoramento da geração através do sistema supervisório do inversor. A Figura 8 mostra as situações antes e depois da limpeza realizada no dia 13/05.  A geração média saltou de 300 kWh diários para cerca de 350 kWh após a limpeza.

 

Figura 8 Monitoramento de geração fotovoltaica com o sistema supervisório do inversor

Figura 8: Monitoramento de geração fotovoltaica com o sistema supervisório do inversor

 

A geração de um sistema fotovoltaico depende, sobretudo, da irradiância e da temperatura de operação dos módulos. A presença de sujeira está diretamente ligada à redução da irradiância recebida pelos módulos. A sujeira pode ainda, quando depositada de forma concentrada em alguns pontos, ocasionar o superaquecimento das células.

 

Figura 9 A limpeza periódica é necessária para garantir o bom desempenho do sistema fotovoltaico

Figura 9: A limpeza periódica é necessária para garantir o bom desempenho do sistema fotovoltaico

 

Conclusão

Este artigo mostrou dois casos em que se evidencia o efeito da sujeira sobre o desempenho dos módulos fotovoltaicos. No primeiro caso verificamos uma situação de elevada sujidade. Um dos módulos apresentava elevada concentração de sujeira e teve sua curva I-V alterada com o deslocamento do ponto de máxima potência, o que pode impactar a geração dos demais módulos ligados em série. Em casos extremos a concentração de sujeira pode levar ao superaquecimento das células fotovoltaicas, o que impacta o desempenho da geração e pode reduzir a vida útil do módulo ou causar incêndios em situações extremas. No segundo caso analisado verificou-se um sistema que apresentava um considerável nível de sujidade. Após a limpeza a geração diária do sistema teve aumento perceptível. Nos casos analisados foram abordados dois sistemas fotovoltaicos de pequenas dimensões. A limpeza periódica dos módulos fotovoltaicos é necessária em sistemas fotovoltaicos de qualquer tamanho. Nas usinas solares a limpeza deve integrar a rotina de operação e manutenção. A determinação da periodicidade da limpeza deve considerar a redução da geração da energia, que pode ser verificada a partir do monitoramento da geração.

Referência

[1] E. Y. Sakô, J. Lucas de Souza Silva, D. d. Bastos Mesquita, R. Espino Campos, H. S. Moreira and M. Gradella Villalva, “Concepts and Case Study of Mismatch Losses in Photovoltaic Modules,” 2019 IEEE 15th Brazilian Power Electronics Conference and 5th IEEE Southern Power Electronics Conference (COBEP/SPEC), Santos, Brazil, 2019, pp. 1-6, doi: 10.1109/COBEP/SPEC44138.2019.9065311.

 


TAGS:
módulo fotovoltaico