Os módulos e os sistemas fotovoltaicos operam com níveis de tensão potencialmente perigosos para a segurança humana.
Nos módulos fotovoltaicos e nas instalações há uma grande preocupação em proporcionar isolação elétrica entre as partes ativas (que produzem potenciais elétricos) das partes que terão contato direto com pessoas (molduras, cabos, caixas de junção e vidros).
Uma medida importante da isolação elétrica de um módulo fotovoltaico é sua resistência de isolamento.
A resistência de isolamento é analisada em laboratórios de certificação e é um dos principais requisitos de segurança para a homologação dos módulos fotovoltaicos. Este teste tem como objetivo analisar a corrente de fuga que surge com a aplicação de uma tensão elevada, verificando-se consequentemente a resistência de isolação do módulo [Hernandez,2010].
O teste da resistência de isolamento em alta tensão é realizado no Brasil por orientação da portaria 004/2011 do INMETRO, de acordo com os procedimentos listados na norma internacional IEC 61215.
A portaria 004/2011 do INMETRO, em concordância com a IEC 61215, regulamenta os testes de certificação de módulos fotovoltaicos no Brasil, a fim de conceder a etiqueta de qualificação e permitindo, portanto, a inserção do equipamento no mercado brasileiro.
Dentre os testes obrigatórios para a qualificação dos módulos fotovoltaicos, é necessário que estes sejam aprovados em dois testes relacionados à resistência de isolamento, de acordo com a nomenclatura da IEC 61215: 10.3 – Teste de isolamento a seco e 10.15 – Teste de corrente de fuga com umidade. O primeiro será abordado com mais detalhes neste artigo, enquanto o segundo será apresentado em um artigo futuro.
Embora o isolamento de um módulo fotovoltaico tenha um papel fundamental em relação à prevenção de choques elétricos, o isolamento das partes ativas também cumpre com o objetivo de evitar que as células fotovoltaicas entrem em contato com o meio externo, evitando o seu contato com ar, água e outras impurezas e o seu consequente processo de degradação.
Segundo a premissa de grande parte dos fabricantes de módulos no mercado, os módulos são desenvolvidos para operar ao longo de 25 anos, portanto é essencial que todos os potenciais riscos à durabilidade dos módulos sejam mitigados, seja através de aspectos construtivos mecânicos ou elétricos.
O teste de isolação elétrica é também realizado nos sistemas fotovoltaicos em campo. Os procedimentos dos testes laboratorial e de campo diferem, mas o objetivo é o mesmo: testar a segurança da isolação elétrica do sistema fotovoltaico.
Enquanto o teste laboratorial testa a resistência elétrica entre os terminais elétricos de um único módulo e sua moldura metálica, o teste de campo mede a resistência elétrica entre os terminais da string fotovoltaica e o barramento de terra da instalação (ao qual devem estar conectadas as molduras de todos os módulos).
No Brasil segue-se a norma ABNT NBR 16274:2014 para a realização do teste de resistência elétrica em campo, que diz respeito às strings dos sistemas fotovoltaicos.
No comissionamento de plantas fotovoltaicas, a ABNT NBR 16274:2014, atualmente em revisão, especifica dois métodos para o ensaio de resistência de isolamento do arranjo fotovoltaico.
A norma cita que em situações em que os resultados são questionáveis, um ensaio com umidade deve ser realizado, entrando em consonância com o que é realizado nos laboratórios, embora os parâmetros de aprovação sejam distintos.
O assunto do teste de isolação no comissionamento dos sistemas fotovoltaicos é abordado com maior profundidade no artigo publicado no Canal Solar: “Ensaio de resistência de isolamento em sistemas fotovoltaicos”.
A figura abaixo mostra os componentes de um módulo fotovoltaico típico, com vidro frontal e lâmina plástica (back sheet) traseira.
Os componentes elétricos dos módulos são encapsulados entre camadas de plástico e vidro. O encapsulamento é realizado por um processo de laminação a vácuo, que deve resultar em um empacotamento hermético e livre de ar em seu interior.
O encapsulamento dos componentes elétricos tem o propósito de fornecer estabilidade mecânica e isolamento das partes elétricas com o meio externo, evitando, especialmente, que as células fotovoltaicas sofram degradação pelo contato com ar ou água.
Na figura acima vemos como são estruturados os seguintes componentes de um módulo fotovoltaico típico:
A partir da composição de um módulo fotovoltaico típico é possível modelar a resistência de isolamento [Roy,2015].
A partir desta modelagem é possível notar que a resistência de isolamento será calculada a partir da resistência resultante do paralelo entre R1, R2, R3 e R4 com as resistências R5, R6, R7 e R8. Deve-se notar que a resistência do isolamento não leva em consideração as células fotovoltaicas, os diodos de by-pass e nem os cabos solares, devido ao fato de serem partes ativas e condutivas.
A respeito da contribuição de cada uma das resistências, temos as seguintes ordens de grandeza:
A resistência equivalente entre os terminais apresentados na figura anterior pode ser calculada a partir da seguinte equação:
Req = (R1+R2+R3+R4)*(R5+R6+R7+R8)/(R1+R2+R3+R4+R5+R6+R7+R8)
Esta resistência usualmente possui dimensão de gigaohms [G?], segundo [Roy,2015].
Segundo a norma IEC 61215, o módulo terá a sua resistência de isolamento aprovada caso o produto da resistência de isolamento pela sua área seja maior ou igual a 40 M?.m2. Esta resistência deve ser medida entre os terminais curto-circuitados e a moldura do módulo, conforme ilustrado na Figura 2.
Realizando-se uma conta simples, pela lei de Ohm a corrente de fuga associada a este teste deve ser inferior a 1 mA. Vale ressaltar que a resistência de isolamento em campo leva diversos outros fatores em sua composição, bem como a possibilidade de fuga de corrente através de eletrodutos e eletrocalhas.
A seguir encontra-se a Tabela 1 da norma ABNT NBR 16274:2014, que mostra a parametrização de testes e os valores mínimos esperados para o ensaio de resistência de isolamento em strings fotovoltaicas.
Neste cenário, temos dois valores distintos de parâmetro de resistência. Como os módulos são validados em laboratórios, então assume-se que a resistência de isolamento, quando recém fabricados, é de pelo menos menos 40 M?.m2
Como os módulos em geral têm área próxima de 3,1 m2 a resistência de isolamento (medida entre os dois terminais e a moldura), é de pelo menos 13 M?.
Em segunda instância, os módulos em campo estão sujeitos a diferentes condições ambientais, como temperaturas mais altas e umidades potencialmente mais altas, o que afeta diretamente o comportamento do isolamento dos módulos.
Do ponto de vista de segurança, a corrente de fuga de 1 mA não apresenta grandes riscos à saúde caso algum indivíduo esteja submetido. Entretanto, o envelhecimento do módulo fotovoltaico pode reduzir a resistência e elevar essa corrente de fuga ao longo do tempo.
Uma baixa resistência de isolamento do módulo fotovoltaico resulta em uma amplitude maior da corrente de fuga que circula nas partes inativas (não condutoras elétricas), acelerando os processos de degradação.
O aumento da corrente de fuga (ou a falha da isolação) intensifica fenômenos de degradação como o efeito PID [Vinturini, 2919] e processos corrosivos que degradam as células fotovoltaicas [Li, 2018].
No que tange o isolamento construtivo do módulo fotovoltaico, um mau isolamento das partes ativas do meio externo faz com que as células e os meios encapsulantes tenham contato com impurezas que aceleram os processos de degradação, podendo gerar bolhas, delaminação, amarelamento das células, degradação das soldas e consequentemente, gerando o mismatch em strings [Manganiello, 2015][Sako, 2019]
Segundo a norma, o propósito deste teste baseia-se em determinar se as partes vivas do módulo fotovoltaico são suficientemente isoladas das partes acessíveis.
Por se tratar de um teste que abrange todos os componentes do módulo fotovoltaico, serve de referência para os demais listados na IEC.
Em outras palavras, antes e depois de o módulo passar por outros testes de degradação, como o de estresse térmico, salt spray, congelamento, degradação UV (ultravioleta), estresse mecânico, dentre outros, ele tem a sua resistência de isolamento avaliada, o que eleva a importância deste ensaio.
Como pré-requisito do teste, a temperatura ambiente aceitável para o ensaio é de 25 ºC, com variações de até ±5 ºC, e a umidade relativa do ar do ambiente deve ser inferior a 75%.
Os equipamentos necessários para o ensaio são: (a) fonte de alta tensão CC com limitador de corrente, capaz de aplicar as tensões necessárias para o ensaio e (b) instrumento capaz de medir a resistência de isolamento. Um equipamento que incorpora ambas as funções, conhecido como testador “hipot” é apresentado na figura abaixo.
Inicialmente é necessário curto-circuitar os terminais do módulo fotovoltaico no terminal positivo do “hipot” por meio de um rabicho em Y, conforme mostra a Figura 4.
O terminal negativo do testador de “hipot” deve ser conectado à moldura metálica do nmódulo fotovoltaico em teste, conforme a Figura 5.
Em situações em que a amostra não possui moldura, como em alguns módulos do tipo double glass, é necessário cobrir as bordas com uma folha de alumínio e em seguida conectar o terminal negativo nesta estrutura auxiliar.
Com a montagem de teste finalizada, o testador de “hipot” deve ser configurado conforme os parâmetros exigidos por norma e de acordo com a área do módulo e a tensão máxima de sistema (geralmente 1000 V ou 1500 V). As dimensões do módulo e a sua classe de tensão são encontradas na etiqueta que deve acompanhar o produto.
O primeiro teste de isolamento trata-se de um processo de pré-condicionamento, onde se aplica uma tensão Vteste equivalente a 1000V + 2*Vmáx sistema, ou seja, para módulos de 1000 V, deve ser aplicada uma tensão de 3000 V, enquanto para módulos de 1500 V a tensão de 4000 V deve ser aplicada.
O testador de “hipot” deve ser configurado de forma que a subida de tensão não ultrapasse a taxa de 500 V/s até atingir a tensão de teste especificada. O pré-condicionamento ocorre durante o período de 1 minuto sob a tensão de teste.
Para que o módulo seja aprovado no pré-condicionamento, duas condições são determinantes:
Para que a última condição seja satisfeita, o testador de “hipot” é configurado para que o teste seja interrompido (e consequentemente reprovado) com uma corrente de fuga superior a Ifuga = Vteste / Risol.
Em seguida um segundo teste é executado, com as mesmas premissas de condição de reprovação. Neste segundo caso, entretanto, o módulo fotovoltaico é exposto a uma tensão igual à sua máxima tensão de sistema durante 120 segundos.
Caso o módulo fotovoltaico não atinja o limite de corrente de fuga estabelecido no início do teste, ele pode ser considerado aprovado.
Na certificação INMETRO, que atualmente respeita a portaria 004/2011, o teste de isolação é o primeiro ao qual o módulo é submetido (depois do estágio inicial de estabilização à luz solar). Sendo aprovado neste teste, o módulo é submetido aos testes seguintes. A portaria 004/2011 do INMETRO segue os mesmos parâmetros e procedimentos especificados na norma IEC 61215.
A norma IEC 61215 inclui um grande conjunto de testes que provocam o envelhecimento acelerado e causam a degradação dos módulos fotovoltaicos: salt spray (ambiente salino), damp heat (calor úmido), exposição à luz UV (ultravioleta), carga mecânica, ciclo térmico (aquecimento e resfriamento) e humidity freeze (congelamento em ambiente úmido).
Esses testes intensificam processos de degradação que ocorreriam naturalmente ao longo da vida útil do módulo fotovoltaico, razão pela qual o teste de isolação elétrica é realizado antes e depois de cada um desses testes.
O teste de resistência de isolamento delineado pela IEC 61215, e aderido pela portaria 004/2014 do INMETRO, estabelece os procedimentos necessários para aferir a capacidade de isolamento de um módulo fotovoltaico em condição seca.
A resistência de isolamento de um módulo fotovoltaico é proporcionada pelas camadas de materiais isolantes usados na sua fabricação, tendo o EVA como principal material contribuinte para este isolamento.
De acordo com a norma da IEC 61215, a resistência de isolamento mínima para aprovação do módulo é de 40 M?.m2. Valores abaixo são considerados potencialmente perigosos em relação à corrente de fuga, podendo causar choques elétricos ao indivíduo que manuseia o módulo.
Além de um isolamento elétrico, as células fotovoltaicas precisam estar muito bem vedadas em relação ao ambiente externo, visto que o seu contato com água, ar e impurezas, pode acelerar processos de degradação. O teste de isolação elétrica acaba sendo, indiretamente, uma medida da qualidade do encapsulamento dos componentes internos, cuja qualidade é essencial para o prolongamento da vida útil do módulo.
[Roy,2015] Roy, J. N. (2015). Modelling of insulation characteristics of Solar Photovoltaic (SPV) modules. Solar Energy, 120, 1–8. https://doi.org/10.1016/j.solener.2015.06.036
[Vinturini, 2919] Mateus Vinturini, O efeito PID e sua ação sobre os módulos fotovoltaicos, 2019. https://canalsolar.com.br/o-efeito-pid-e-sua-acao-sobre-os-modulos-fotovoltaicos/
[Li, 2018] Li, J., Shen, Y. C., Hacke, P., & Kempe, M. (2018). Electrochemical mechanisms of leakage-current-enhanced delamination and corrosion in Si photovoltaic modules. Solar Energy Materials and Solar Cells, 188(May), 273–279. https://doi.org/10.1016/j.solmat.2018.09.010
[Manganiello, 2015] P. Manganiello, M. Balato, and M. Vitelli, “A Survey on Mismatching and Aging of PV Modules: The Closed Loop,” IEEE Trans. on Indus. Electron., vol. 62, pp. 7276–7286, 2015.
[Sako, 2019] Sako, E. Y., Lucas De Souza Silva, J., Bastos Mesquita, D. De, Espino Campos, R., Moreira, H. S., & Gradella Villalva, M. (2019). Concepts and Case Study of Mismatch Losses in Photovoltaic Modules. 2019 IEEE 15th Brazilian Power Electronics Conference and 5th IEEE Southern Power Electronics Conference, COBEP/SPEC 2019, 1–6. https://doi.org/10.1109/COBEP/SPEC44138.2019.9065311
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